sábado, 26 de maio de 2012

V
Quando estava aborrecida, abria o Livro do Desassossego à sorte, como quem joga tetris sem encaixar as peças. No fundo, gostava de fragmentos. Não discutíamos, limitavamo-nos, a maior parte do tempo, a sorrir no vazio das nossas ilusões, sem saber o que estávamos a fazer ali. Eu tinha medo e ela também. 
- Vai buscar a Justine e lê-me as últimas páginas ao ouvido. Ninguém precisa de saber que a virtude não leva a lado nenhum.
E eu segredava-lhe o expoente da devassidão, alterando o ritmo à medida dos espasmos do seu corpo dormente, na exacta proporção da poesia dos seus contornos. E a música...ah! a música, a valsa erótica que nos acompanhava nesta dança cega até a noite terminar, tocava ininterruptamente até acabarmos sepultadas no crepúsculo do nosso desejo. 

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